Efetividade do procedimento de interdição segundo pesquisas do projeto meta 2 e legislação vigente, na comarca de Montes Claros

REVISTA SOCIOLOGIA JURÍDICA – ISSN: 1809-2721

Número 14 – Janeiro/Junho 2012

Efetividade do procedimento de interdição segundo pesquisas do projeto meta 2 e legislação vigente, na comarca de Montes Claros [1]

Autoras:

Cláudia Adriana Rodrigues Leite. – Acadêmica do 9º Período do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros -Unimontes – 2º Semestre/2012.

Jéssica Martins Pereira. – Acadêmica do 9º Período do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros -Unimontes – 2º Semestre/2012.

Professores Orientadores:

Ana Clarice Albuquerque Leal Teixeira.- Professora Especialista do Curso de Direito da UNIMONTES e Coordenadora do módulo “Família” do Projeto de Pesquisa:A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros. Coordenadora do Programa S.A.J. Itinerante/Curso de Direito – Unimontes.

Ionete de Magalhães Souza.- Professora Mestre – Mestrado em Direito – pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC (2001). Doutoranda em Direito pela Universidad Del Museo Social Argentino. Coordenadora do Módulo de Família do Projeto de Pesquisa: A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros . Coordenadora do Programa S.A.J. Itinerante/Curso de Direito – Unimontes.

Reinaldo Marcos Batista Teixeira– Professor Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Coordenador do Módulo de Família do Projeto de Pesquisa: A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros.

Resumo: O presente trabalho aborda a celeridade processual. O apelo pela efetividade processual e plena satisfação, já motivou numerosas reformas legislativas, além da criação de programas que visam promover mudanças no sistema do judiciário em si. Entre eles surge o Programa Meta 2, criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e imposta aos juízos de todo o Brasil. O trabalho visa analisar o instituto da interdição segundo pesquisas do projeto de pesquisa A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros – Módulo Família. Apresenta-se a moderna visão civil-constitucional da interdição, nessa esteira, tem o objetivo de investigar através de pesquisas as causas que levam a não duração razoável dos procedimentos de interdição. A partir da identificação das causas é possível indicar medidas, a fim de contribuir para os objetivos sociais e constitucionais.

Sumário: 1. Introdução. 2 Análise do instituo da Interdição e seu procedimento especial sob o prisma civil-constitucional. 2.1 Considerações sobre o instituto da interdição. 2.2 Razões processuais intrínsecas ao procedimento de interdição que promovem a morosidade do procedimento e sua constitucionalidade. 3 A pesquisa aos processos inscritos no Meta 2 e seus resultados.3.1 Causas procedimentais que promovem a morosidade dos processos das varas de família na comarca de Montes Claros – Minas Gerais, segundo as pesquisas do projeto Meta 2. 3.2 Os reflexos dos resultados obtidos na pesquisa, especialmente no que se refere ao instituto da interdição. 4.Considerações Finais. 5. Referências.

Palavras-Chave: Interdição Judicial. Curatela. Projeto Meta 2.

Abstract: The present work aims to approach the procedural celerity. The petition for the procedural effectiveness and plenary satisfaction has already motivated numerous legislative reforms, besides the creation of programs that aim to promote changes in the judiciary system. Among them arises the Program “Meta 2” generated by the National Council of Justice (NCJ) and imposed to the judgments of the whole country. The work intends to analyze the institute from the interdict according to the research project “A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros – Módulo Família.” It presents the modern civil  and constitutional vision from the interdict, which has an objective investigate through researches the causes that led to a non reasonable duration of the interdict procedures. With the causes identified it is possible to indicate ways, in order to contribute for the social and constitutional goals.

Keywords: Judicial Interdict, Trusteeship. Project “Meta 2”.

 

1.INTRODUÇÃO

O instituto da Curatela previsto no Código Civil Brasileiro 2002 (CC/2002), não se trata simplesmente do ato de interditar alguém incapaz de administrar sua vida e seus bens, coloca-se à tona a personalidade jurídica da pessoa. Surgindo uma visão modernista civil-constitucional, colocando em ênfase os direitos fundamentais, em especial o princípio da dignidade da pessoa Humana. A personalidade é um direito em si, uma vez que é parte integrante da pessoa. O conceito de personalidade pode-se confundir com a idéia de capacidade jurídica. A interdição judicial é o instituto pelo qual se presta proteção aos maiores incapacitados, aqueles que não possuem discernimento de administrar sua vida e seus bens, tendo a impossibilidade de cuidar de seus próprios interesses. O objetivo do instituto é zelar pela vida e o patrimônio do interditado. É nomeado por lei um curador atribuído a reger a vida e os bens do curatelado. O processo da interdição conta com alguns aspectos peculiares, que muitas vezes pode levar à morosidade do feito. Em que pese o direito fundamental a duração razoável do processo e da efetividade plena em todas as pretensões, mais se apresentam urgentes as demandas que envolvem a tutela dos direitos diretamente ligados a capacidade e dignidade da pessoa humana. O presente artigo se propõe a investigar as causas que levam a não duração razoável dos procedimentos de interdição, assim como a pesquisa direta aos processos inscritos no Programa Meta 2 do CNJ, aliado a pesquisa bibliográfica para que se possa localizar os fatos que impedem o transcorrer célere, ou razoável do procedimento voluntário de interdição.

2 ANÁLISE DO INSTITUTO DA INTERDIÇÃO E SEU PROCEDIMENTO ESPECIAL SOB O PRISMA CIVIL-CONSTITUCIONAL

2.1 Considerações sobre o instituto da Interdição

O artigo 1º do Código Civil/2002 (CC/2002) diz que todas as pessoas possuem capacidade de direito e deveres na ordem civil, contudo nem todos são de fato capazes de adquirir direitos e de assumir deveres em relações jurídicas patrimoniais.

A capacidade jurídica é dividida em duas: capacidade de direito e capacidade de fato. A capacidade de direito é reconhecida a toda pessoa, natural ou jurídica, razão pela qual pode ser confundido com a personalidade, atributo também a todos inerente. Por outro lado, define-se a capacidade de fato como a aptidão para prática pessoal dos atos da vida civil.

A capacidade jurídica é plena, corresponde à efetiva possibilidade, concedida pela ordem jurídica, do titular de um direito atuar no plano concreto, sozinho, sem qualquer auxílio de terceiro.

A capacidade é a regra e a incapacidade é a exceção. Dessa forma a incapacidade é a restrição da plena capacidade, tendo como consequência a limitação ao exercício dos atos civis. Assim o ordenamento civil protege os incapazes através da restrição de alguns direitos, mas permitindo o exercício de outros ou um exercício diferido, assistido, não retirando a plena capacidade.

Em apanhando geral pode-se dizer que o incapaz possui capacidade jurídica, detém personalidade jurídica, logo, possui direitos e deveres. Contudo, por ser-lhe cerceada a capacidade de fato, em grau inversamente proporcional ao discernimento, só poderá exercer sua capacidade jurídica assistido por pessoa da confiança do Juízo, que o faz em nome do Estado, que será chamado curador.

A corrente modernista civil – constitucional de Nelson Rosenvald e Cristiano Farias questiona a Teoria das Incapacidades, demonstrando a importância de um olhar direcionado à dignidade da pessoa do interditando ao invés da preconização da preservação do patrimônio, que outrora foi à única fundamentação da interdição.

[…] A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAIS, 2011, p.66)

Além disso, quando o instituto é aplicado sem atenção a pessoa humana a ser interditada, em suas particularidades, nota-se que o instituto ao invés de proteger, segrega as pessoas interditadas. Neste sentido, os autores Nelson Rosenvald e Cristiano Farias explicam que o ser humano não pode ser classificado em categorias jurídicas. A interdição deve ser utilizada de acordo com a característica pessoal e em casos de ausência permanente de discernimento.[2]

A curatela surge nesse panorama como o encargo imposto a uma pessoa natural para cuidar e proteger uma pessoa maior de idade que não pode se autodeterminar patrimonialmente por conta de uma incapacidade. É, visivelmente, uma forma de proteção a alguém que, embora maior de idade, não possui a plena capacidade jurídica. (ROSENVALD; FARIAS, 2011, p.976.)

         A curatela é um instituto de interesse público, dedicado a reger a pessoa maior de idade, porém incapaz, não possuindo discernimento de reger sua vida por sie/ou administrar seus bens. Está disciplinada nos artigos 1.767 a 1.783 do CC/2002.

Cezar Fiúza conceitua o instituto como “o encargo conferido a alguém, para gerenciara a vida e o patrimônio dos maiores incapazes.” (FIUZA, 2011, p.163)

Nesse sentido complementa Caio Mário que “toda via a curatela deve alcançar também outros casos por natureza e efeitos específicos.” (PEREIRA, 2010, p.513.)

 Clóvis Beviláqua o define como “o encargo público, conferido por lei, a alguém para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores, que por si não possam fazê- lo”. (apud RODRIGUES, 2004 p. 394)

A interdição judicial teve origem no Direito Romano, era admitida a maiores não sujeitos à pátria potestas, a menores púberes e a maiores de idade, a pedido do próprio interessado. O antigo Código Civil Brasileiro de 1916 (CC/1916) trazia o rol dos sujeitos a curatela: os loucos de gênero, os surdos-mudos que não tivessem recebido uma educação adequada, os pródigos, posteriormente acrescentando os toxicômanos. O Código de Processo Civil Brasileiro de 1.973 (CPC/1973) abandonou a expressão “loucos de Todo o gênero” e a substituiu por “Portadores de anomalia psíquica”.

A principal finalidade da interdição é a proteção do incapaz no tocante a seus interesses e garantias e a preservação do seu patrimônio, assim é um instituto assistencialista. Outrossim, tem caráter publicista, pelo fato de ser dever do Estado zelar pelos interesses dos incapazes, relembrando que o referido encargo é delegado a um curador. Também possui caráter supletivo de capacidade, ínsito no dever do curador de ter que representar ou assistir o curatelado. Ainda, é um instituto temporário, pendurando somente enquanto a causa da incapacidade se mantiver e quanto a esta houver certeza absoluta.

O artigo 1767 do CC/2002 apresenta sol com os sujeitos a curatela geral. No primeiro inciso, aludiu a legislação aos que por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil. A opção legislativa de reconhecer a tais pessoas a interdição está no fato de que algumas doenças ou estados psicológicos diminuem a capacidade de compreensão da vida e do cotidiano. Com efeito, são pessoas que, tanto por situações congênitas como por adquiridas, não são habilitadas para administração de sua pessoa e seus bens, ainda que se trate de fenomenologia temporária.

Assinala Pontes de Miranda que os portadores de anomalia psíquica estão legalmente sujeitos a curatela, quer se trate de dementes, de oligofrênicos, de fraco espírito (imbecis), de dipsômanos (impulsão irresistível a beber), quer se diagnostique demência afásica, fraqueza mental senil, degeneração, psicastenia, psicose tóxica (morfinismo, cocainismo, alcoolismo), psicose autotóxica (esgotamento, uremia etc.), psicoseinfectuosa (delírios pós-infecciosos etc.), paranóia, demência arteriosclerótica, demência sifilítica etc., uma vez que amoléstia altere o uso vulgar de suas faculdades, tornando-o incapaz de exercer normalmente os atos da vida civil. (DIAS, 2008, p.631)

É interessante ressaltar que o ordenamento civil diferentemente do penal não reconhece os chamados intervalos lúcidos, sendo irrelevante para o reconhecimento da capacidade. Por medida de segurança jurídica, enquanto decretada a capacidade jurídica, os atos praticados sem assistência do curador serão nulos, ainda que realizados em momento de lucidez, com efeito, o interditado poderia se valer de regra contrária para fazer e desfazer acordos promovendo prejuízos a terceiros, bem como poderiam estes impor obrigação a incapazes alegando que estavam temporariamente lúcidos quando a assumiram.

O nosso ordenamento não admite os chamados “intervalo lúcidos”. Os atos praticados pelo ametal interditado serão sempre nulos, ainda que no momento aparentasse alguma lucidez. É que a incapacidade mental é considerada um estado permanente e contínuo. É fácil imaginar os infindáveis debates que ocorriam se fossem admitidos, uns alegando que o ato foi praticado durante um intervalo lúcido e outros negando tal fato, gerando constantes e exaustivas demandas e trazendo incertezas nas relações jurídicas. (GONÇALVES, 2011, p.666-667)

Posteriormente, a legislação cita os que por outra causa duradora, não puderem exprimir sua vontade, assim aqueles que possuam natureza patológica, traumática ou de etiologia diversa, não tenham o necessário discernimento.

Como por exemplo, pessoas acidentadas, com seqüelas nas funções cerebrais, surdos-mudos, desde que não tenham recebido educação apropriada que a possibilite emitir sua vontade (CC arts. 3ª, III, e 1.767, II), pois neste caos precisam de proteção, visto serem absolutamente incapazes. Nem todo surdo-mudo é passível de curatela, não se justificando, portanto, interdição de pessoas não totalmente surda, capaz de manter conversação (RT, 228:226). (DIAS, 2008, p.633)

Em seguida, trata o referido dispositivo, no seu inciso terceiro, dos deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos. No que se refere aos deficientes mentais, vê-se uma repetição do legislador, que contemplou estes sujeitos no inciso primeiro comentado alhures. Ébrios habituais são aqueles que têm alucinações ou embrutecimento da mente em razão de deterioração mental alcoólica, ou que desenvolveram psicose aguda relacionada ao alcoolismo. Os toxicômanos são considerados incapazes em virtude de vício ou dependência de substâncias tóxicas em geral, seja cocaína, morfina, ópio, maconha ou outra, bem como o álcool. A Lei nº 4.294/1921 equipara intoxicados habituais e psicopatas dispondo sobre estabelecimentos especiais de tratamentos e de terapia ocupacional. Caso os viciados em tóxicos venham a sofrer redução da capacidade de entendimento ou a embriaguez houver evoluído para um quadro patológico, aniquilando a capacidade de autodeterminação do viciado, comprovada através de perícias médicas, pode o Juiz decretar a interdição.

Ainda, estão sujeitos de acordo com inciso IV do citado artigo, os excepcionais sem completo desenvolvimento, bem como os deficientes que possuem retardamento mental em grau médio, ou seja, sem retirar por completo discernimento da pessoa, mas que comprometa a compreensão plena da vida. São consideradas excepcionais as pessoas que nascem com anormalidades físicas e mentais, que portadoras de problemas neuropsíquicos, os quais se revelam tanto no aspecto físico como no psíquico e sensorial, apresentam déficit mental. Exemplificando são assim considerados os portadores da síndrome de Down.

Finalmente, trata-se da curatela dos pródigos. De certo que é um tema complexo envolvendo quatro áreas distintas: Direito, Psiquiatria, Psicanálise e a Economia. Caio Mario os define como “aqueles que são caracterizados por dissiparam, desordenadamente seus haveres para a preservação dos interesses de sua família.” (PEREIRA, 2010, p. 285)

Nelson Rosenvad e Cristiano Farias, nessa mesma esteira, definem-no como “a pessoa que, desordenadamente, gasta os seus haveres, dilapidando o seu patrimônio, de modo comprometer a sua subsistência”. (ROSENVALD; FARIAS, 2011.p.980)

Em razão deste apontado destempero na administração do próprio patrimônio, a ponto de por em risco a subsistência própria e de seus dependentes, o pródigo é considerado relativamente incapaz, necessitando de um curador. Por se tratar de um descontrole restrito ao patrimônio, o Juiz fixará limites em que o pródigo poderá atuar sozinho, se por outro lado o fizer fora dos limites concedidos, o ato será anulável a requerimento do curador, consorte, ascendente ou descendente.

 

A interdição do pródigo só interfere em atos de disposição e oneração do seu patrimônio. Pode inclusive administrá-lo, mas ficará privado de praticar atos que possam desfalcá-lo, como “emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado”. Tais atos dependem da assistência do curador. Sem essa assistência, serão anuláveis. (GONÇALVES, 2011, p.671.)

Os casos de interdição até então comentados, compõe o chamado regime geral. Contudo, há também curatelas que possuem peculiaridades, assim sendo destacadas da disciplina geral do instituto, são elas a curatela do nascituro e a curatela do ausente.

Silvio Rodrigues define “o nascituro como o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno” (RODRIGUES, 2004, p.400). O nascituro, muito embora não possua capacidade ou personalidade, possui potencial vida, logo possui expectativa de direitos, esta é o objeto da proteção legal através da curatela.

A regra é que a genitora seja responsável por tutelar os direitos do nascituro que carrega em seu ventre, contudo quando esta esteja impedida de fazê-lo, ou seja, quando não puder exercer o poder familiar, nem havendo quem o detenha, deverá ser nomeado curador ao nascituro nos termos do artigo 1779 do CC/2002 e 878 do CPC para que ao nascer a criança possa usufruir os direitos – herança, legado, doação – sobre o qual já possuía expectativa antes mesmo de adquirir personalidade.

Lecionando sobre o tema Nelson Rosenvald e Cristiano Farias alertam que a hipótese de curatela dos interditos é rara, o que torna a abordagem sem interesse prático:

[…] o artigo é de pouquíssima incidência prática, somente se justificando em meio a uma estranha e sucessiva combinação de fatores: I estar grávida uma mulher; II ser falecido o genitor; III ter o nascituro sido beneficiado com alguma herança, legado ou doação; IV estar a mãe, por algum motivo, afastado do poder familiar. Dificílimo é imaginar o que pode implicar na perda do poder familiar de uma mãe cujo filho ainda não nasceu. Apesar da concepção visivelmente patrimonialista do citado dispositivo legal, é senhor propugnar por uma interpretação civil-constitucional, afirmando que a principal obrigação imposta ao curador do nascituro é garantir o seu nascimento com vida e sua saúde integral. Até porque não nascendo com vida, sequer poderá desfrutar dos bens que foram resguardados. (ROSENVALD; FARIAS, 2012, p.984-985)

Por sua vez a curatela do ausente tem como objetivo resguardar os bens da pessoa que desapareceu de seu domicílio sem deixar noticias e sem deixar representante para administrar seu patrimônio. O curador terá o compromisso de inventariar os bens, administrá-los, receber e repassar os eventuais rendimentos, bem como prestar contas ao ausente se retornar, ou a seus herdeiros. A curatela é extinta após um ano de ausência, oportunidade em que a ausência se converte em sucessão provisória, se requerida pelos interessados.

O CC/1916 incluía os ausentes no rol de sujeitos a interdição. Mas, o legislador do CC/2002 acertadamente determinou que não que se falar em interdição, uma vez que a declaração da incapacidade depende de perícia, nos termos da regulamentação geral. Ainda assim, reconheceu a necessidade de proteção aos bens e interesses do ausente, através da curatela dos ausentes.

Existem ainda as chamadas curatelas oficiais, que se diferenciam da disposta no artigo 1.767do CC/2002, pelos seus objetivos mais específicos, atinentes à administração dos bens e a defesa de determinados interesses e não afeitos à regência de pessoas. Uma vez utilizada é exaurida. São elas:

  1. a instituída pelo testador para os bens deixados a herdeiro ou legatário menor (art.1.733, § 2º);
  2. a que se dá à herança jacente (art.1.819);
  3. a que dá ao filho quando os seus interesses colidirem com o detentor do poder familiar (art.1.692; lei 8.069/90, art.142, parágrafo único, e 148, parágrafo único)
  4. a dada ao incapaz que não tiver representante legal ou, se assistido, tenha com seu tutor ou curador conflito de interesses;
  5. a conferida ao réu preso que seja parte em relação processual, curadoria que se limita a assistência jurídica-processual;
  6. a que se dá ao revel citado por edital ou com hora certa, que se fizer revel, também restrita as questões processuais (curadora in litem, art. 9º, I e II – CPC)
  7. a que se dá ao enfermo ou portador de deficiência física. Convém ressaltar que não se trata de uma interdição, mas de mera transferência de poderes, semelhante, mutatis mutandis, a um mandato, em que o curador exercerá a administração total ou parcial do patrimônio. A modalidade será utilizada quando o paciente, por enfermidade ou deficiência, mesmo em pleno gozo de suas faculdades mentais, não tenha outorgado mandado a procurador de sua confiança e não está em condições de assinar a procuração ou de outro modo constituir procurador. Insta alertar que essa interdição especial é temporária, caso o curatelado não possa exprimir sua vontade de modo permanente, estará, então, sujeito a curatela ordinária.

2.2. Razões processuais intrínsecas ao procedimento de interdição que promovem a morosidade do procedimento e sua constitucionalidade

O procedimento de interdição é uma espécie de jurisdição voluntária, que segue rito especial delineado nos artigos 1.177 a 1.198 do CPC.

A definição de voluntária, em um primeiro momento causa certo incômodo, uma vez que, poder-se-ia conjecturar a hipótese não incomum de o interditando resistir a pretensão, apresentando sua defesa.

Contudo, ainda que haja resistência ao pedido, a jurisdição é voluntária, pois há apenas um interesse, qual seja: a preservação e proteção do incapaz. Esta que é o principal escopo do procedimento de interdição, neste sentido:

Significa que a interdição somente é justificável, em ótica civil-constitucional, em nome das próprias necessidades do interditando. E essas necessidades devem ser compreendidas em função de seus interesses, devendo ser respeitada como manifestação de seu livre desenvolvimento e de vida. (ROSENVALD; FARIAS 2010, p.587)

De fato, ainda que haja resistência do interditando a ação, tem-se que o interesse de ambos é a preservação e proteção do interditando, presume-se que o interesse do autor com a ação é proteger o interditando e seus bens, o que de certo também é interesse do interditando, logo não há que se falar em conflito de interesses.

Explicitado que o interesse do autor ao propor a interdição deve ser o de proteção dos interesses do interditando, uma vez que este não possui discernimento suficiente para proteger per si seus bens e interesses, nesta esteira convém apresentar as pessoas legítimas a deflagrar o procedimento de interdição.

A extensa lista de legitimados,disposta nos artigos 1.768 do CC/2002 e 1.177 do CPC, decorre do ímpeto legal de proteção dos incapazes. São eles os pais (um ou ambos), tutores, cônjuge – convém destacar que a separação de fato impede o exercício da curatela, mas não a propositura da ação – companheiro – muito embora tenha havido um “cochilo” da lei neste sentido – parentes, assim definidos os ascendentes, descendentes e colaterais até o quarto grau, por consanguinidade ou afinidade e ainda o ministério Público em casos excepcionais como impossibilidade dos legitimados e nos casos de anomalia psíquica e doença mental grave.

O autor deverá instruir sua petição inicial com laudos médicos que demonstrem a incapacidade do interditando. Mas, a prova documental produzida pelo autor, ainda que robusta não pode excluir a instrução delineada na legislação processual.

A imposição de farta instrução é consequente lógico da proteção aos direitos e garantias fundamentais, afinal, a capacidade é regra, e a incapacidade quando declarada limita diversos direitos fundamentais, limita a cidadania, portanto, deve decorrer de decisão satisfatoriamente fundada em provas.

“É preciso sublinhar, ademais, que a decisão judicial de interdição atinge, frontalmente, alguns valores constitucionalmente preservados em favor da pessoa, como a liberdade e a intimidade.” (ROSENVALD; FARIAS, 2010, p.987.)

Decorrente lógico da necessidade de profícua instrução é a indispensabilidade do interrogatório judicial, que é o ato posterior a propositura da ação, antes mesmo da apresentação da contestação. Se o interditando não puder ir até o Juízo, terá o Magistrado que se deslocar até o interditando para averiguar pessoalmente a incapacidade para o exercício dos atos da vida civil, sob pena de nulidade absoluta – artigo 1771 do CC/2002 e 1181 do CPC.

A necessidade de um interrogatório judicial é requisito de potencial morosidade do procedimento de interdição, uma vez que pode obrigar o juiz a realizar grandes deslocamentos, especialmente em nossa comarca – foco do presente trabalho – que abrange diversas localidades, muitas delas de difícil acesso.

Contudo, ainda que a prova seja robusta, abdicar mão deste requisito em prol da celeridade, seria ferir o devido processo legal, garantia constitucional insculpida no artigo 5º, inciso LIV da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988 (CRFB/1988), sendo certo que o processo seria célere, mas não seria devido.

Após o interrogatório, o interditando tem o prazo de 05 dias para apresentar sua defesa, ou seja, para resistir ao pedido. Permite a lei que qualquer parente sucessível constitua advogado para defender os interesses do interditando.

Neste mister destacam-se dois potenciais fatores de morosidade, a uma tem-se que a ausência de defesa não gera revelia, ou seja, não dispensa a instrução e nem torna verdadeiros os fatos alegados na inicial, uma vez que a ação se refere a estado da pessoa. A duas, segundo a doutrina civil – constitucional este prazo de defesa é impróprio.

Significa dizer que a defesa poderá ser apresentada em qualquer tempo ao longo do processo, e deverá ser considerada, neste sentido advogam os professores Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias: “Todavia, nada impede – ao contrário, tudo recomenda – que seja recebida a defesa promovida extemporaneamente, até mesmo em respeito a peculiar natureza do procedimento.” (2010, p.993) Acompanham ainda os professores Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (2009, p..967).

A defesa apresentada em momento posterior pode obrigar nova dilação probatória, abertura de novos prazos e reexame de documentos, mas, é devida sob a luz da ampla defesa, e a celeridade em seu detrimento não é razoável, ou seja, não seria constitucional.

Ainda no que se refere a instrução, a doutrina civil-constitucional defende a necessidade de prova pericial realizada por equipe multidisciplinar, com profissionais diferentes dos que diagnosticaram o paciente e expediram os atestados que instruíram a inicial.

Chama a atenção à expressão assistida por especialistas, utilizada no plural pelo dispositivo legal. È que a compreensão precisa da eventual incapacidade mental reclama, de fato, a realização de laudo pericial por equipe Multidisciplinar, composta não somente por médicos, mas também por psicólogos e assistentes sociais. (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p.995)

Importante consignar que o laudo médico que determina a doença mental não autoriza per si a decretação da interdição, porque ao Magistrado cabe identificar no caso concreto até que ponto aquela anomalia psíquica impede o interditando de exercer os atos da vida civil, afinal, a CRFB/1988 veda qualquer espécie de discriminação, inclusive ao portador de anomalia psíquica.

Neste diapasão, por mais que a curatela tenha como único desiderato a proteção do interdito, ela não pode ser declarada sem que seja oportunizada defesa a este e sem que haja prova cabal, ou seja, ainda que a supressão do procedimento promova uma celeridade favorável ao interditando, o processo seria nulo de pleno direito, uma vez que não existe duração razoável do processo sem devido processo legal procedimental.

A importância de uma decisão judicial célere no procedimento de curatela dos interditos é cediça, afinal, o incapaz pode dilapidar seu patrimônio, piorar sua condição de saúde, bem como pode ofender direitos de terceiros, uma vez que sem discernimento permanece com liberdade de agir na vida civil.

Contudo, a decisão que promove a interdição não pode se abster de derivar do procedimento previsto em lei, uma vez que as formalidades legais são necessárias para proteção do próprio cidadão cuja incapacidade se argúi.

Neste diapasão, convém determinar como procedimento de interdição de duração razoável aquele em que há o cumprimento efetivo de todas as etapas processuais que asseguram a ampla defesa, a preservação a dignidade da pessoa humana, mas que ainda assim, atendem a limites razoáveis de tempo de modo a não por em risco as garantias de proteção do interditando.

3 A PESQUISA AOS PROCESSOS INSCRITOS NO META 02 E SEUS RESULTADOS.

3.1 Causas procedimentais que promovem a morosidade dos processos das varas de família na comarca de Montes Claros – Minas gerais, segundo as pesquisas do Projeto Meta 02.

A Emenda Constitucional nº 45/2004 (EC nº45/2002) trouxe a lume a garantia processual constitucional cuja aplicação efetiva atualmente é a mais esperada pelos jurisdicionalizados brasileiros, qual seja a “duração razoável do processo”, que significa em simples abordagem que o processo atendendo a suas especificidades formais será julgado em tempo suficiente para que a decisão seja efetiva e promova o efeito esperado pelas partes.

“Não se trata de celeridade a todo custo e sim de razoabilidade temporal, de extirpação das dilações indevidas. Com efeito, o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional.” (DIDIER JÚNIOR, 2010, p.64)

É certo que a referida garantia já existia mesmo antes de sua inserção no rol das garantias constitucionais do artigo 5º da CRFB/1988, uma vez que o Pacto San José da Costa Rica do qual o Brasil é signatário e que ingressou em nosso ordenamento segundo os trâmites legais já a previa. Sua determinação expressa no inciso LXXVIII foi de suma importância para evidenciar a vontade do legislador de vê-la efetivada.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recebeu a importante atribuição de zelar pelo judiciário, inclusive no que se refere a duração razoável do processo e a fim de promovê-la criou o Programa Meta 2, que consiste basicamente em  Identificar e  julgar os processos judiciais mais antigos sendo estes considerados os distribuídos até 31.12.2005 (em 1º, 2º grau ou Tribunais Superiores).

Com o slogan “Meta 2: bater recordes é garantir direitos” o judiciário se propôs a esgotar os estoques de processos que congestionavam as secretarias e enfim proporcionar aos jurisdicionalizados decisões em prazo razoável.

Em que pese os esforços empreendidos não foi possível concluir a meta integralmente, ainda existem processos distribuídos antes de 2005 cujo julgamento está pendente.

Com efeito, segundo o último relatório do CNJ em todo o País foi cumprida tão somente 75,85% dos processos distribuídos até 2005.[3]

A fim de investigar as causas do não alcance da Meta 2, a Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) através da Coordenadoria de Pesquisa aprovou o Projeto de Pesquisa: “A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros”, com vistas a identificar os processos inscritos no Meta 2 na comarca de Montes Claros e analisar as causas da demora no julgamento destes.

O referido projeto investigou 106 dos processos ativos inscritos no Programa Meta 2 do CNJ que tramitam nas varas de família da comarca de Montes Claros-MG.

Para tanto foi aplicado um questionário, no qual se pretendia averiguar as causas que levaram aqueles processos a não terem um andamento razoável e serem inscritos no programa Meta 2 do CNJ. Uma vez identificada as causas, poderiam ser estas combatidas e prevenidas, para que se pudesse contribuir para um processo de duração razoável.

Foram elaboradas questões para definir dentre os atuantes no processo aqueles que promovem atos ou omissões mais capazes de promover a morosidade dos processos, o resultado foi que 66% dos processos têm o provimento jurisdicional moroso em razão de atos/omissões das partes e dos advogados. Somam-se a eles, os atos/omissões da secretaria que correspondem a 7% e a complexidade da causa que alcança 27%.

Com efeito, ainda segundo as pesquisas, em 13% dos casos a documentação acostada a inicial era incompleta e somente em 30% dos casos os advogados/partes cumpriram todos os prazos. Sendo que em 19% as partes não cumpriram qualquer dos prazos.

Não incomum comparam a advocacia ao sacerdócio, de fato, o advogado precisa acompanhar diuturnamente seus processos, e atuar pró-ativamente para o rápido provimento jurisdicional. Mas, a análise dos processos leva a crer que se trata muito mais de inércia das partes do que descaso dos procuradores.

Pôde-se constatar que em muitos casos, especialmente no que toca a sucessão, as partes não tem condições de satisfazer os tributos inerentes a demanda, em outros casos se vislumbra a dificuldade de algumas partes em adiantar os honorários periciais.

Ademais, é preciso consignar que se trata de vara de família, e as relações familiares são absolutamente distintas das demais, ódio e amor, consenso e dissenso andam quase sempre juntos, trata-se especialmente de sentimentos, de intimidade. Não incomum, as partes entram com uma ação por uma raiva momentânea, mas depois instalada a paz, retomam suas relações, simplesmente desistem da demanda, sem contatar seu procurador.

Por outro lado, muitas vezes a parte se vale de um processo judicial apenas para se “vingar” do ex – consorte que de alguma maneira lhe magoou com o fim do relacionamento. Procura-se através do procedimento judicial provocar dor e desconforto a outra parte, a troca de ofensas em audiência não é rara, e muitas vezes não se refere a partilha de bens ou ao quantum da pensão alimentícia e sim a traições e descompromissos de um relacionamento passado, vê-se no processo a oportunidade de tornar pública toda sua indignação contra a outra pessoa, para de alguma forma constrange-la. E, de regra, é da natureza humana a resposta, e a troca de acusações não tem fim, tornando o processo um “acerto de contas” que melhor se resolveria em uma terapia. O objeto da lide é tão somente um desejo secundário, o intuito primário é deveras o litígio, a briga.

Ainda que o advogado saiba que o acordo é a melhor solução, não pode impor sua vontade sobre a do seu cliente, não pode compor em seu nome sem sua autorização. E se a parte titular do interesse não pretende acordo, ao contrário, deseja que o litígio se arraste por tempos a fim de assim atingir o máximo possível a outra parte, o processo acaba por se protrair no tempo, sem culpa do advogado.

Nota-se, com efeito, que o processo judicial de alimentos, divórcio litigioso, guarda entre outros da vara de família, muitas vezes servem como manutenção de uma relação que acabou pelo amor, mas que pelo menos umas das partes pretenda que siga de alguma maneira, ainda que pelo ódio. Enquanto tramita o processo, ainda há relacionamento, contato, este é, deveras, o intimo interesse de muitas das partes que ingressam no judiciário.

Convém ainda lembrar que muita embora não seja regra, as vezes o processo para porque a parte simplesmente some, se muda, sem dar maiores explicações ao seu procurador, deixando a ermo seu processo judicial.

Mas, não só as partes e seus procuradores são responsáveis pela mora na prestação jurisdicional. Também a carência de recursos humanos no judiciário brasileiro tem relevante atuação, uma vez que as pesquisas apontaram que em 57% dos casos a secretaria não atua em prazo razoável, especialmente em suas funções de juntar, publicar e concluir.

È realidade nacional a desproporção entre a quantidade de processos distribuídos e o número de servidores. Com efeito, conforme pesquisa recente do programa “Judiciário em números” realizado pelo CNJ, no ano de 2010, havia 84 milhões de ações em trâmite no judiciário, mas apenas 16,8 mil membros do judiciário – juízes, desembargadores e ministros.

A comarca de Montes Claros não foge a regra, são duas varas de família, cada uma das secretarias possui 06 servidores, dentre eles 05 oficiais de apoio e 01 escrivão. Segundo dados do TJMG no ano de 2012 foram distribuídos, em média, 3.608 processos na 2ª Vara de Família e 2.571 processos na 1ª Vara, ou seja um total de 6.179 processos distribuídos em 5 meses, para não dizer dos muitos em tramitação, para somente 12 servidores.

Resultado dessa desproporção é a constatação, também da pesquisa, que em 75% dos casos os processos restaram sem qualquer movimentação por mais de 100 dias, ou seja, tempo morto.

Segundo as pesquisas, destarte, a razoável prestação jurisdicional não depende de uma legislação diferenciada, e sim de um maior comprometimento das partes e de seus procuradores. Igualmente, indispensável o investimento em recursos humanos e informatização das secretarias dos Juízos.

3.2 Os reflexos dos resultados obtidos na pesquisa, especialmente no que se refere ao instituto da interdição

O presente trabalho, por distribuição, delimitou sua pesquisa na investigação dos processos de interdição de competência das varas de Família da comarca de Montes Claros, a fim de apurar em um primeiro momento se nesta seara há duração razoável do processo e em resposta negativa apurar as causas deste descumprimento das garantias constitucionais.

Foram utilizados para a grandiosa pesquisa três métodos de abordagem. O método indutivo, apresentando hipóteses para o possível problema que leva a morosidade das ações do Projeto Meta 2, permitindo obter conclusões gerais a partir de premissas individuais.Além do método monográfico que consisti no estudo sobre o instituto da Interdição com o objetivo de obter generalizações sobre o tema. E por último utilizou-se o método estatístico analisando e coletando os dados dos processos colocando em forma de gráficos.

Em um apanhado geral a pesquisa analisou os fatores intrínsecos que levam inscrição dos 106 processos no programa de metas do CNJ. Entre eles destacam-se à demora no cumprimento dos prazos, demora na sentença, demora nas publicações pela Secretaria, o processo parado por muito tempo, a complexidade da causa, o comportamento das partes, do advogado e do órgão judiciários perante o processo. As ações de maior morosidade em nossa comarca são de inventário, de separação litigiosa, de investigação de paternidade e de alimentos.

Com feliz surpresa pode-se constatar que dos 106 processos inscritos no Programa Meta 2 do CNJ, investigados, nenhum se refere à ação de interdição.

A celeridade nos processos de interdição da Comarca de Montes Claros – MG é festejada, pois, o devido processo legal nos casos da curatela de interditos leva quase sempre a uma maior morosidade, conforme já se elucidou no tópico alhures.

Com efeito, são muitas as especificidades formais a fim de preservar o interditando, já que a interdição é medida por demais gravosa, que retira completamente a liberdade da pessoa, e deve ser aplicado de maneira excepcional, após efetivo processo judicial, o devido processo legal no presente caso visa preservar a liberdade e dignidade do interditando, o que, per si, torna o procedimento cada vez mais moroso.

Por outro lado as pesquisas comprovaram que a morosidade dos processos não é resultado de normas complexas, mas sim de uma deficiência na participação das partes e procuradores e no funcionamento das secretarias dos órgãos jurisdicionais.

O procedimento de interdição, como já dito é de jurisdição voluntária, em regra com poucas manifestações das partes antes da sentença, o que pode justificar o fato das principais causas de morosidade não terem afetado os procedimentos desta natureza. Permitindo então que ele se apresente na comarca de Montes Claros como de duração razoável, destarte constitucional.

Com apenas 2 Varas de Família e poucos servidores, há  urgência da criação de mais Varas de Família na  comarca de Montes Claros, uma vez que é constante o crescimento da população da cidade e seu município, aumentando, assim, a carga no Poder Judiciário. A grande demanda de processo, sem uma estrutura judiciária adequada, faz com que se cause o descrédito e insatisfação das partes diante da morosidade da justiça, uns dos principais combates do Projeto Meta 2.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A morosidade é uma realidade que deve ser combatida. A EC nº 45/2004 trouxe como um dos atributos da reforma do judiciário, a garantia da razoável duração do Processo como um princípio fundamental a ser efetivado. O Programa Meta 2 do CNJ foi uma forma de promoção do princípio da celeridade e da efetividade das decisões judiciais. Nesta esteira, o presente artigo teve como desafio analisar os problemas que obstam a efetividade da razoável duração do processo na comarca nas Varas de Família da comarca de Montes Claros – MG. Destaca-se a ação de interdição que, entre as demais de competência da Vara, obteve resultado positivo, se apresentando como um procedimento célere, sem deixar de cumprir as especificidades do procedimento. Por outro lado, a pesquisa revelou que a intenção e omissão das partes e os limites da atuação dos procuradores, bem como a desproporcionalidade entre o número de processos e a quantidade de servidores do Judiciário são grandes responsáveis pela morosidade. Destarte, o sonhado equilíbrio entre o processo e o tempo não depende de novas leis, e sim de investimento em conscientização das pessoas sobre a importância do acordo, e em recursos humanos e informatização do judiciário. Com efeito, uma Secretaria com razoável número de servidores reduz o “tempo morto” dos processos, obrigando, assim, as partes a estarem mais próximas do processo, bem como o tornando mais célere, o que certamente reduz as omissões e abandonos. Com estas ações simples, o Judiciário conseguiria efetivar a legislação processual vigente, suprimindo assim parte determinante das causas de morosidade, para que a duração razoável constatada hoje nos processos de interdição da comarca de Montes Claros – MG se estenda as demais ações.

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[1] Artigo científico do Projeto de Pesquisa A Duração Razoável do Processo e o Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Montes Claros – Modulo família.Universidade Estadual de Montes Claros- Unimontes.

 [2] Resumo da Palestra “A necessária revisão da teoria das incapacidades”, palestrante, Nelson Rosenvald. Disponível em: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/noticia/index/id/7953

Acesso em: 14 de Abril de 2012, as 20hoomin.

[3] Relatórios divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/metas_judiciario/2009/meta2/meta2_panoramanacional_2009.jpg. Acesso em: 16 de Abril de 2012, as 16hoomin.