Autonomia sindical ou judicialização? A intervenção do Poder Judiciário em eleições sindicais no Rio de Janeiro

REVISTA SOCIOLOGIA JURÍDICA – ISSN: 1809-2721

Número 05 – Julho/Dezembro 2007

Autonomia sindical ou judicialização? A intervenção do Poder Judiciário em eleições sindicais no Rio de Janeiro

Rafael Almeida Jatahy Ferreira – Graduação em Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestrando em Ciências Jurídicas e Sociais do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (PPGSD/UFF). Pesquisador da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ).

E-mail: rafael.jatahy@gmail.com

Resumo: No presente trabalho objetivamos analisar como os conflitos políticos internos da classe trabalhadora acabam sendo judicializados. Ou seja, o processo de “judicialização da política sindical”, onde os próprios ativistas do movimento sindical recorrem ao Poder Judiciário na busca de uma decisão que solucione conflitos internos ao sindicato. Para tanto, temos como objeto de estudo três casos de eleições sindicais que sofreram intervenção da Justiça: a do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda e Região Sul Fluminense, a do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro (SINTRASEF) e a do Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de Janeiro (SINTERGIA).

Sumário: 1. Introdução; 2. As eleições sindicais que sofreram intervenção do Poder Judiciário; 2.1.  Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda e Região Sul Fluminense; 2.2. Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro (SINTRASEF); 2.3. Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de Janeiro (SINTERGIA); 3. Organização sindical brasileira e normatividade estatal; 4. Judicialização da política e das relações sociais; 5.  Mudanças na ação sindical; 6. Referências bibliográficas.

Palavras-chave: Sindicatos – Judicialização – Direito do Trabalho – Ação Sindical.

Abstract:: In the present work we attempt an analysis on how political conflicts within working class end up being judicialized. In other words, our research concerns the “judicialization of Union politics”, that is, when the very activists of the Union movement recur to Judiciary in order to solve internal conflicts on Union. To do so, we took as subject-matter three cases of Union elections that suffered intervention from Judiciary: the Steelworkers Union of Volta Redonda, the Public Service Workers Union of Rio de Janeiro and the Energy Workers Union of Rio de Janeiro elections.

Key-words: Unions – Judicialization – Labour Law – Union Action

  1. Introdução

A história contemporânea do ocidente não pode ser contada sem que seja mencionado o papel cumprido pelas organizações sindicais. A luta dos trabalhadores por direitos, tanto sociais quanto políticos, ajudaram a modelar boa parte da atual estrutura do Estado. Ao mesmo tempo, a partir do momento em que os trabalhadores passaram a atuar por dentro desses espaços conquistados nas instituições estatais, percebemos a remodelagem de suas próprias organizações sindicais e políticas.

Durante o século XX, em diversos países, os sindicatos foram institucionalizados e conflito entre capital e trabalho foi tornado público, devendo ser mediado – e em diversos casos, resolvido – pelo Estado, por meio dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Grande parte dos trabalhos que tratam das relações existentes entre as organizações sindicais e a Justiça tem como objeto o conflito de classes, ou seja, procuram analisar o enfrentamento judicial entre trabalhadores e patrões, visando, cada qual, seus interesses próprios, geralmente opostos.  Essa utilização do Poder Judiciário como arena de luta entre as classes não é nova no Brasil, já que, a partir da Revolução de 1930, optou-se por um modelo legislado de relações de trabalho no qual o Estado se qualifica exatamente para administrar este tipo de conflito.

Entretanto, entendemos que outro tipo de análise também se faz importante. Estamos falando de situações em que conflitos internos dos sindicatos são judicializados, casos em que trabalhadores buscam o Poder Judiciário para que este resolva disputas sindicais. Fatos assim são importantes para a compreensão da relação desses atores com a estrutura do Estado, notadamente com a Justiça.

Sendo assim, pretendemos no presente trabalho analisar como os conflitos políticos internos da classe trabalhadora acabam sendo judicializados. Ou seja, o processo de “judicialização da política sindical”, onde os próprios ativistas do movimento sindical recorrem ao Poder Judiciário na busca de uma decisão que solucione conflitos internos ao sindicato.

Para tanto, temos como objeto de estudo três casos de eleições sindicais que sofreram intervenção da Justiça: a do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda e Região Sul Fluminense, a do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro (SINTRASEF) e a do Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de Janeiro (SINTERGIA). A escolha desses casos não foi aleatória. Por um lado, sua escolha se justifica em razão do grande número de trabalhadores representados por esses sindicatos. Ademais, trata-se de processos eleitorais que ocorreram recentemente.

Para a análise dessa judicialização das eleições sindicais, acreditamos que alguns fatores devem ser considerados: a relação histórica entre a organização dos sindicatos e a normatividade estatal; o processo de judicialização da política e das relações sociais, que tem a própria normatização das relações de trabalho como situação paradigmática; e o processo de adaptação institucional que ocorreu com o movimento sindical durante a década de 1990. Iremos analisar cada um desses pontos separadamente.

  1. As eleições sindicais que sofreram intervenção do Poder Judiciário

2.1.  Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda e Região Sul Fluminense

O Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda e Região Sul Fluminense é um dos maiores sindicatos dessa categoria no Estado do Rio de Janeiro. Além disso, faz parte da história do movimento sindical brasileiro, devido à greve de 1988 na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) que, infelizmente, resultou na ocupação da mesma pelo exército e na morte de três jovens trabalhadores.

Na última eleição para a diretoria deste sindicato, que ocorreu nos dias 06 e 07 de julho de 2006, a disputa no âmbito do Poder Judiciário teve papel central. Em fevereiro de 2006, o sindicalista Renato Soares entrou com uma ação na justiça requerendo a publicação de um novo edital de convocação para as eleições da entidade, que estavam marcadas para abril do mesmo ano. O autor da ação, que pretendia se candidatar à presidência do sindicato, alegava que o primeiro edital havia sido publicado no jornal “O Globo”, mas em uma seção que não circula em Volta Redonda, e que a publicação em um diário local não teria saído nos exemplares que chegaram às bancas. Afirmava, ainda, que em razão da  não publicação do edital, apenas uma chapa conseguiu se inscrever: a da situação,  que dirigia o sindicato fazia doze anos e era ligada à Força Sindical.[1]

Assim, a juíza da 6a Vara Cível de Volta Redonda, Raquel de Andrade, determinou a publicação de novo edital no jornal “Diário do Vale” que, segundo a juíza, seria o periódico de maior circulação da cidade.

Após a votação, houve nova intervenção judicial. A juíza da 1a Vara Trabalhista de Volta Redonda[2], Linda Brandão Dias, determinou a suspensão da contagem dos votos para que fossem apurados indícios de irregularidade durante os dois dias de eleição. No dia 13 de julho, a juíza decidiu que os fatos ocorridos na eleição não haviam prejudicado o processo eleitoral. Tais fatos foram: duplicidade de nomes nas listas de votação, atraso na abertura das principais urnas (da Usina Presidente Vargas) e a demora na publicação dos locais de votação na CSN. As urnas, que por decisão judicial estavam guardadas na sede da Polícia Federal em Volta Redonda, foram apuradas com o acompanhamento das polícias Militar, Civil e Federal, além do Ministério Público do Trabalho.[3]

A chapa de oposição, presidida por Renato Soares, acabou saindo vitoriosa e, por nova ordem do juízo da 1a Vara do Trabalho de Volta Redonda, no dia 19 de julho os votos apurados foram incinerados na sede do sindicato.[4]

Esta não foi a primeira vez que houve intervenção do Judiciário no processo eleitoral do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda  e Região Sul Fluminense, tendo em vista que na eleição anterior, em 2002, houve uma discussão judicial em torno da publicação dos editais de convocação para a eleição. Neste episódio, sindicalistas ligados à Central Única dos Trabalhadores foram  à Justiça requerer a publicação de um novo edital de convocação para as eleições, uma vez que este foi publicado apenas no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, e não em jornal de grande circulação, o que fez com que somente a chapa da situação realizasse a inscrição. Desta vez, entretanto, o juízo da 5a Vara Cível de Volta Redonda entendeu regular este tipo de publicação, já que constava no estatuto do sindicato.[5]

2.2. Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro (SINTRASEF)

O SINTRASEF é o maior sindicato da CONDSEF (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Serviço Público Federal), contando com cerca de 30 mil trabalhadores filiados, entre ativos e aposentados.

As eleições para a diretoria do sindicato contaram com três chapas, sendo uma da situação (chapa 2) e duas de oposição (chapas 1 e 3). A primeira coleta de votos, que ocorreu entre os dias 19 e 12 de setembro de 2007, foi marcada por diversas irregularidades. Logo no primeiro dia, as urnas saíram com várias horas de atraso, sendo que, das 118 urnas, apenas 14 chegaram aos locais de votação. Ainda foram apontados problemas como, por exemplo, o caso da urna 96 (urna itinerante que ia de Volta Redonda a Seropédica), que tinha apenas 46 filiados aptos a votar e apareceu às 1h 26 min da manhã do dia 13, após o término do prazo das eleições, com 817 votos.[6]

Tendo em vista tais problemas, as chapas 1 e 3 posicionaram-se pela anulação do processo e convocação imediata de novas eleições. Essa demanda foi encaminhada à Comissão Eleitoral, que a acatou. Os candidatos da chapa da situação, inconformados, questionaram a decisão judicialmente, solicitando ao Poder Judiciário a imediata contagem dos votos. Entretanto, não houve decisão favorável à contagem dos votos. A Juíza da 44a Vara do Trabalho do Rio de Janeiro ordenou que as urnas fossem lacradas, sem que pudessem ser abertas sem ordem judicial, além de afirmar que nada impossibilitaria a realização de novas eleições.[7]

Entre os dias 15 e 17 de outubro uma nova coleta de votos foi realizada, saindo vencedora a chapa 3. Os integrantes da chapa da situação, que se recusaram a participar da nova eleição, continuam até o presente momento reivindicando a direção do SINTRASEF.

2.3. Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de Janeiro (SINTERGIA)

Representado os trabalhadores de empresas como a Light, Furnas, Eletrobrás, Eletronuclear, CEG, CET-RIO, Rioluz e a Cepel, o SINTERGIA é o maior sindicato de trabalhadores em energia da federação nacional da CUT. Operando com um orçamento de R$ 3,5 milhões ao ano,  a entidade conta com aproximadamente cinco mil filiados, entre seus sócios ativos e aposentados.

Nos dias 13 e 14 de setembro de 2006, foram realizadas as eleições para renovar a diretoria do SINTERGIA, com dois grupos em disputa. Uma das chapas representava a situação e era formada por sindicalistas ligados à CUT. Já a chapa de oposição, contava com o apoio da Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas).

Entretanto, o fato gerador da principal controvérsia da eleição começou alguns meses antes do pleito, mais especificamente em fevereiro do mesmo ano, quando a direção do sindicato aumentou em dois mil o número de filiados, ao incluir quase todos os empregados de duas empresas terceirizadas de Furnas, a Bauruense e a Enesa.

A Comissão Eleitoral acabou declarando irregular esta lista, tendo em vista que, coincidentemente, todos os trabalhadores tinham a mesma data de filiação, 14 de fevereiro de 2006, data limite para adquirir a condição de votante nas eleições de setembro, segundo o estatuto da entidade. Além disso, foi descoberto que estes trabalhadores nunca haviam pago a mensalidade ao sindicato, condição sine qua non para serem considerados sócios.

A chapa da situação resolveu questionar judicialmente tal decisão, sendo que o juiz da 29a Vara do Trabalho do Rio de Janeiro determinou, liminarmente, a inclusão dos nomes destes trabalhadores na lista de votantes. Ocorre que, após a eleição, verificou-se que, se não fossem considerados os votos dos trabalhadores da Baruense e da Enesa, que estavam sub judice, a vitória seria da oposição. Tal fato fez com que a disputa judicial passasse a ser central para a vitória eleitoral. Os membros da situação continuam dirigindo o sindicato e a ação judicial ainda segue na Justiça do Trabalho.

  1. Organização sindical brasileira e normatividade estatal

A partir da chamada “Revolução de 1930”, iniciaram-se no Brasil mudanças significativas que iriam preparar as bases para a passagem de uma sociedade agrária para uma sociedade urbano-industrial. No plano econômico, houve uma reorientação de investimentos e prioridades para o setor industrial, sem que houvesse, entretanto, qualquer ruptura com os interesses da grande lavoura. Já no plano institucional, foram percebidas alterações no papel do Estado, que passou a ser economicamente mais interventor e politicamente mais centralizador, passando a ter uma conformação autoritária. O Estado seria visto, ainda, como o regulador das relações entre trabalhadores e empresários. Sendo assim, apresentava-se como o “inventor da legislação social.”[8]

Percebe-se que, num contexto de falência do Estado liberal-oligárquico, o governo de Vargas buscava recompor a “capacidade hegemônica do Estado, ampliando suas bases de sustentação pela incorporação das classes sociais emergentes: a burguesia urbano-industrial e os trabalhadores urbanos.”[9]

Assim, no governo de Getúlio Vargas, o Estado com bases liberais é reorganizado em bases corporativas, uma vez que serão formados os arranjos tripartites de concertação política, que vão ligar os sindicatos ao Estado e dar a este a direção dos processos econômicos que irão auxiliar o desenvolvimento da ainda fraca burguesia industrial.

“O corporativismo, porque constituía a forma de organização e da sua participação nas decisões do Estado, mas também porque era concebido, como fator disciplinar das classes e de colaboração entre elas, como um mecanismo de reorganização e planejamento da economia em bases nacionais, figurava neste projeto como o instrumento, por excelência, de reordenamento das relações entre segmentos das classes dominantes e destas com o Estado e de obtenção do consentimento de parcelas das classes dominantes.”[10]

Todo este processo de mudanças na legislação social e criação de novos direitos para os trabalhadores se deu “por cima”, ou seja, sem qualquer participação efetiva das classes populares e com a repressão, por parte do Estado, dos elementos contrários a este projeto. Além disso, era claro o objetivo do governo de Vargas em controlar e neutralizar as ações sindicais, como analisa Ricardo Antunes:

“[…] se a legislação trabalhista pode ser entendida como conquista da classe operária, é inegável que o Estado, ao atender suas reivindicações cotidianas e imediatas, conseguiu crias as bases sociais para sua própria sustentação junto aos subalternos, uma vez que, junto com o atendimento às pressões populares, descarregava um vasto conteúdo manipulatório expresso na ideologia do varguismo. Porém, esse duplo aspecto, por vezes contraditório, do relacionamento do Estado com a classe operária comportava uma unidade cuja essência era o caráter desmobilizador da presença varguista no seio do movimento operário e sindical, condição também necessária para uma acumulação industrial centrada na exploração da força de trabalho.”[11]

A mudança no sentido de estabelecer o controle estatal sobre os sindicatos é percebida claramente se analisarmos a diferença com a legislação anterior a este período. O Decreto no 1.637 de 1907, que regulamentava o direito de sindicalização aos trabalhadores urbanos, tinha como base a concepção liberal da época, pois dava toda liberdade de associação aos diversos setores profissionais e determinava expressamente que os sindicatos profissionais poderiam se constituir de maneira livre, sem autorização estatal. Para obter o registro do sindicato, este deveria apenas apresentar seus estatutos, os nomes de seus membros, sede, forma e finalidades.[12]

Já o Decreto no 19.770 de 19 de março de 1931, demonstrava o caráter corporativo da nova legislação sindical, uma vez que estabeleceu o modelo de sindicato único por categoria e região, a estrutura vertical por categorias e a tutela do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio sobre as entidades sindicais.[13]

Inicialmente, percebe-se que esta estrutura sindical por categoria presente no artigo 1o do Decreto, já demonstra uma certa “organização pelo alto” do movimento sindical e a limitação da liberdade sindical. Também podemos pensar que tal estrutura, ligada à atividade do empregador, está de acordo com os interesses do varguismo, que pretendia que os sindicatos discutissem apenas questões econômicas, sendo proibidos de realizar qualquer movimentação política ou ideológica. Outro objetivo do varguismo era facilitar a conciliação entre as classes.

Tal estrutura corporativa, que foi confirmada em 1943 pelo Estado Novo, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), teria sobrevivido até os dias de hoje, tendo passado por diversas mudanças políticas e econômicas. Curiosamente, o chamado sindicalismo corporativo sobrevivera ao fim do Estado Novo em 1945, ao Golpe Militar de 1964, à redemocratização nos anos oitenta e foi consagrado pela Constituição de 1988. Nem as reformas neoliberais (que na Inglaterra de Thatcher destruiu o corporativismo) teriam sido capazes de acabar com estrutura sindical estabelecida em 1931, de acordo com Armando Boito Jr.:

“Esta continua baseada no sindicato oficial reconhecido pelo Estado, na unicidade sindical, na fragmentação dos trabalhadores em sindicatos de categoria e de base municipal, nas taxas sindicais obrigatórias impostas a todos os trabalhadores do mercado formal, inclusive os não-sindicalizados, e na tutela da Justiça do Trabalho sobre a ação reivindicativa dos sindicatos”[14].

Obviamente, pode-se observar a marca do corporativismo fascista na matéria sindical e trabalhista presente na Constituição de 1937, tendo em vista que esta teve inspiração e, inclusive, partes inteiras traduzidas da Carta del Lavoro, ícone do corporativismo fascista e totalitário italiano.[15] Ainda, o pensamento corporativo também está presente nas obras dos ideólogos do movimento revolucionário de 1930, como as de Oliveira Vianna e Francisco Campos.[16]

Neste modelo, a produção de regras e normas de uso do trabalho, assim como a regulação da negociação entre capital e trabalho, ocorrem preferencialmente no nível da legislação federal, sendo, portanto, produzidas no parlamento e não em mecanismos composicionais. Diferentemente, nos modelos negociais ou contratuais, a contratação coletiva é o espaço privilegiado de produção das normas.[17]

O direito do trabalho brasileiro, desta maneira, regularia tanto as relações de trabalho entre o patrão e cada um de seus empregados (Direito individual do trabalho) quanto as relações profissionais, por meio de normas para a defesa e representação dos interesses das partes, capital e trabalho (direito coletivo de trabalho). A organização sindical é regulada neste segundo tipo de norma. Ressalte-se que, na Era Vargas, a ordem jurídica definia os sindicatos como parte do aparelho estatal e o direito sindical como parte do direito público.    O Estado, por meio do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, acaba ocupando, assim, o lugar por excelência de produção das normas trabalhistas, tanto coletivas, quanto individuais.

Este passado Varguista vez com que fosse criada uma histórica ligação entre o Estado e a vida sindical. A CLT chegou a disciplinar, nos artigos 529 a 532, a eleição sindical. Estes artigos só foram revogados com o advento da Constituição de 1988, que em seu artigo 8o, inciso I, veda a intervenção ou interferência estatal na organização sindical.[18] Esta proibição pode ser explicada pela participação do movimento sindical originário do “Novo Sindicalismo” na constituinte, uma vez que este defendia a total liberdade sindical, buscando desvincular os sindicatos do Estado.[19]

Segundo os juristas, esta proibição está baseada no Princípio da Auto-organização, no qual o sindicato segue as determinações previstas no estatuto, determinando as regras básicas para seu funcionamento.[20] Tal princípio também está indicado no artigo 3o da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT):

“Art. 3o. As organizações de trabalhadores e de empregadores têm o direito de redigir seus estatutos e regulamentos administrativos, o de escolher livremente seus representantes, o de organizar sua administração e suas atividades e o de formular seu programa de ação. As autoridades públicas deverão abster-se de toda intervenção que tenda a limitar esse direito ou entorpecer seu exercício.”[21]

Sendo assim, o direito veda a intervenção no processo eleitoral sindical, uma vez que a campanha e a votação para os cargos de direção dos sindicatos seriam atividades interna corporis, imunes à vontade estatal.

Entretanto, a doutrina jurídica brasileira e o poder judiciário entendem que, em descumprimento do estatuto do sindicato, é possível a intervenção do poder judiciário, como observa Rodriguez:

“Mas, diante do descumprimento dos estatutos, é possível pensar em ações judiciais propostas por grupos ou indivíduos prejudicados. […] A efetividade dessa imposição de um conteúdo mínimo para os estatutos, constante na letra “d” do art. 518, está na possibilidade de discussão judicial de atos atentatórios às normas estatutárias.”[22] [23]

Sérgio Pinto Martins e Arion Sayão Romita também possuem o mesmo entendimento:

“Na autotutela, o ordenamento autônomo coletivo é auto-suficiente, não necessitando recorrer ao ordenamento estatal para resolver os conflitos entre as partes. O exercício da autotutela não pode, porém, afastar a jurisdição do Estado, de dizer o direito no caso concreto a ele submetido.”[24]

“A autonomia da associação profissional não significa soberania, porque a entidade, embora autônoma em sua vida interior, obedece ao ordenamento jurídico estatal. A associação profissional tem sua autonomia limitada pelo direito dos indivíduos e dos demais grupos sociais, incumbindo ao Estado velar pelo respeito a esse direito. A associação profissional responde perante a ordem jurídica pelas ofensas que cometer contra direitos alheios como qualquer outro sujeito de direitos e obrigações.”[25]

Podemos observar que, mesmo a Constituição Federal de 1988 tendo estabelecido a liberdade sindical, alguns aspectos do “sindicalismo de estado” continuam, uma vez que foram mantidos institutos como a contribuição sindical compulsória e unicidade sindical[26], sem falar no referido entendimento jurídico em torno da possibilidade de intervenção judicial sobre os sindicatos.

  1. Judicialização da política e das relações sociais

O século XX foi testemunha de uma crescente institucionalização do direito na vida, ocupando espaços antes inacessíveis a ele, como certas dimensões da esfera privada. Este processo, chamado de judicialização das relações sociais e da política que, segundo Werneck Vianna, deu fim à rigorosa separação entre o Estado e a sociedade civil (nos termos da tópica liberal da liberdade negativa), foi fruto da emergência de novos detentores de direitos, especialmente no movimento operário.[27]

O Direito do Trabalho, desta maneira, rompe com a concepção ortodoxa do contratualismo liberal. Ao trazer consigo reivindicações históricas do movimento operário, infiltrou no campo do direito um argumento de justiça, uma vez que procurava compensar, por meio da regulação jurídica, a parte “economicamente desfavorecida” nas relações contratadas entre empregadores e empregados. Observa-se, nesse processo, que este ramo do direito passa a conferir um caráter público a relações da esfera privada:

“O Direito do Trabalho será o ramo do direito em que o “desigual” se apresenta como objeto da tutela das leis e no qual as relações mercantis se traduzem em funções técnico-jurídicas. Com ele, o mundo da norma passa a recobrir, quando não abafar inteiramente, o mercado e a organização sindical, com o que se publiciza o movimento social que deu partida ao welfare. A judicialização do mercado de trabalho, com a transformação dos conflitos a ele inerentes em matéria a ser jurisdicionada pelo direito, significou a tentativa de extrair o tema da justiça social da arena livre da sociedade civil, dos partidos e do Parlamento, compreendendo-o como um feito a ser regulado pelo Poder Judiciário, de cuja intervenção dependeria um convivência harmoniosa dos interesses divergentes.” [28]

Historicamente, nos países centrais do capitalismo, podemos perceber que na raiz da legislação social esteve presente o movimento sindical, que após se estabelecer na sociedade civil, conseguiu alcançar a esfera pública por meio dos partidos políticos. Assim, o Estado de Bem-estar Social nasce sobre a base da legislação protetora do trabalho e ordenadora do associativismo sindical. Neste, haverá uma intervenção do Poder Legislativo, que irá “recondicionar a antinomia entre o direito público e o privado, pondo a economia, além do mercado de trabalho, sob a jurisdição da Administração Pública e de suas normas.”[29] Esta é base do corporativismo moderno, no qual o Estado se apresenta como o lugar da representação funcional de grupos de interesse, organizados sob a arbitragem do governo.

Sendo assim, a invasão do direito na visa social brasileira começa a ocorrer a partir da década de 1930, com a institucionalização do corporativismo e do direito do trabalho. Nesta operação jurídico-política a bandeira da igualdade e da justiça é utilizada como recurso para legitimar a modernização burguesa de face autoritária, uma vez que, ao mesmo tempo em que se admitia a legislação sindical, era imposta a tutela estatal sobre os sindicatos. A partir deste momento, passou-se a ter a percepção, na política brasileira, de que o direito deveria ser um instrumento para a modelagem social, solidarizando o mundo do trabalho à razão estatal.[30]

Tal política exige a ampliação do Estado, uma vez que este deveria controlar os ciclos econômicos e garantir a capacidade de consumo da população, para tanto realizava pesados investimentos públicos em infra-estrutura, ao mesmo tempo que fornecia um complemento ao salário social com gastos em educação, seguridade social, assistência médica etc. Ainda, o governo atuava direta ou indiretamente sobre os acordos salariais e os direitos dos trabalhadores.

O Estado social passa a ter, desta forma, uma atuação pró-ativa, diferente da concepção clássica do Estado liberal. Sendo assim, para que as decisões tomadas politicamente fossem publicizadas e aplicadas pela burocracia estatal, deveriam ser, continuamente, traduzidas em normas jurídicas. Como a linguagem e os procedimentos do direito são dominantes nessa forma de Estado, o Poder Judiciário passa a exercitar um novo papel, sendo a “única instância institucional especializada em interpretar normas e arbitrar sobre a sua legalidade e aplicação, especialmente nos casos sujeitos à controvérsias.”[31]

As novas funções do Estado – prever, decidir, regular e dirigir processos econômicos – exigiam que este passesse a se orientar não mais pelo tempo passado, mas pelos tempos presente e futuro, assumindo a sua indefinição e indeterminação. Esta indeterminação do direito acabava por modificar a relação entre os Poderes, visto que a lei, mesmo originada do Poder Legislativo, exigia o acabamento do Poder Judiciário, quando este era provocado pelas  instituições e pela sociedade civil a estabelecer o sentido ou a completar o significado da legislação. Deste forma, a indeterminação e indefinição presentes na legislação do Estado de Bem-estar Social teria concedido ao Poder Judiciário a característica de “legislador implícito”.[32]

As mudanças institucionais e sociais características desse período foram responsáveis, ainda, pela “conformação de um cenário de ação social substitutiva dos partidos e das instituições políticas propriamente ditas, no qual o Poder Judiciário surge como uma alternativa para a resolução do conflitos coletivos, para a agregação do tecido social e mesmo para a adjudicação da cidadania, tema dominante na pauta de facilitação do acesso à justiça.”[33] [34]

De acordo com Werneck Vianna, o Poder Judiciário passa a constituir uma nova arena pública, externa aos espaços clássicos de disputa, que envolviam a sociedade civil, os partidos políticos, a representação e a formação da vontade majoritária. Nesse novo espaço de disputa, o Judiciário passa a ser chamado para resolver demandas oriundas da interpelação direta de indivíduos, de grupos sociais e até de partidos políticos. Assim, os procedimentos que prevalecem são os judiciais, em um tipo de comunicação em que prevalece a lógica dos princípios, do direito material, abandonando as antigas fronteiras que separavam o tempo passado, de onde a lei geral e abstrata tinha seu fundamento, do tempo futuro, aberto à infiltração de critérios éticos e de justiça.[35]

A Constituição Federal de 1988 reforça esse novo papel do Poder Judiciário como “legislador implícito”, uma vez que estabelece institutos como o mandado de injunção e a inconstitucionalidade por omissão.[36] Além disso, as disputas políticas oriundas da ascensão do movimento popular, sobretudo o “novo sindicalismo”, fizeram com que diversas normas constitucionais ficassem “abertas”, sujeitas a futura interpretação.

Ademais, a legitimidade dada aos partidos políticos para propor a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) fez com que partidos minoritários na política sindical brasileira, principalmente de orientação popular, iniciassem um processo de familiarização com os procedimentos específicos do Poder Judiciário, percebendo-o como um espaço legítimo para a aquisição e defesa de direitos.

  1. Mudanças na ação sindical

Como vimos, o Estado Novo converteu a ação sindical em questão de Estado e por meio de diversos controles sobre os mecanismos de seleção e reprodução das elites sindicais, que passaram, a partir da década de 1940, a ser financiadas por um imposto sobre a renda dos trabalhadores. Isso conferiu um caráter público tanto aos conflitos entre capital e trabalho, quanto às conflitos internos ao sindicato.[37]

Entretanto, no final da década de 1970, se inicia um novo capítulo na história do sindicalismo brasileiro. O “milagre econômico” presenciado nessa década havia se baseado, em parte, numa grande exploração dos trabalhadores e no arrocho salarial, o que gerou uma grande insatisfação dos trabalhadores organizados no final da década. Somado a esse fator, temos o início da abertura política, tendo em vista o grande desgaste da Ditadura Militar na sociedade. Neste contexto, surge um movimento sindical que procura romper com a estrutura e a ação do antigo. É o chamado “Novo Sindicalismo”, que culminou na formação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT).

Esta nova central sindical, a CUT, explicitava em seu estatuto o objetivo de transformar os sindicatos em entidades classistas e combativas, organizadas a partir de seus locais de trabalho. Seu programa continha, entre outros aspectos, o fim da política econômica do governo; rompimento dos acordos com o FMI; a liberdade e autonomia sindical; liberdade de organização política; a reforma agrária sob o controle dos trabalhadores; o não pagamento da dívida externa; o fim da Lei de Segurança Nacional; o fim do regime militar e por um governo controlado pelos trabalhadores; eleições diretas para presidente.[38]

A identificação com as lutas sociais fez com que houvesse, durante a década de 1980, um impressionante crescimento do PT e da CUT. O PT passou a assumir postos importantes no Estado, elegendo um grande número de parlamentares e gerindo importantes prefeituras, como São Paulo e Porto Alegre. Seguindo o mesmo caminho, a CUT passou a dirigir as mais importantes categorias de trabalhadores e seus enormes aparatos sindicais.

Entretanto, esse crescimento gerou uma imensa contradição, uma vez que o mesmo processo que os levou a assumir posições e ter uma força que nunca antes uma representação dos trabalhadores havia tido no Brasil, foi, ao mesmo tempo, o fator-chave da reviravolta na própria relação do PT com sua base, com seu programa e, por outra via, paralela, também da CUT, que modificou primeiro a sua estrutura, para depois mudar sua estratégia, já na década de 1990. Esse peso imenso de poder, recursos e responsabilidades no interior do sistema gerava, em toda a CUT e nas diretorias de sindicatos, tremendas pressões burocráticas e atitudes conservadoras em relação à defesa dos lugares alcançados.

Além da burocratização, outra conseqüência desse processo é a corrupção, tendo em vista que as máquinas sindicais, principalmente da estrutura brasileira, movimentam uma quantidade muito alta de dinheiro. Todo sindicato tem um elemento de aparato e forma uma burocracia necessária para o funcionamento da estrutura. Em épocas de mobilização esta burocracia estava sobre pressão das bases. Já em períodos de pouco enfrentamento, ela passava a adquirir uma maior independência e a se movia por interesses distintos, gerados por suas próprias necessidades enquanto aparato. Sendo assim, essa institucionalização fez com que os dirigentes sindicais, com o intuito de preservar seus cargos, passassem a priorizar o pacto e a negociação em detrimento de uma estratégia de contestação ao modelo vigente.[39]

Os debates ocorridos nos congressos nacionais da Central contam a história das mudanças ocorridas, sendo o Terceiro Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores (III CONCUT) um marco nesse processo. Este congresso, que ocorreu em 1988 e foi o maior da história da Central, teve como principal discussão a modificação de seu estatuto. A tendência majoritária dentro da direção da CUT, a  Articulação Sindical, pretendia estabelecer mudanças para que os próximos congressos fossem menores, bem como mudanças na própria estrutura da central, que passaria a ter um estrutura mais verticalizada. Para Iram Jácome Rodrigues, tais mudanças eram apenas a superfície do problema. A questão de fundo era outra e dizia respeito ao papel que deveria desempenhar o movimento sindical no Brasil, especificamente a CUT:

“O III CONCUT representou, com as mudanças estatutárias, o começo da transformação de uma concepção movimentista para uma visão mais organizativa da Central Única dos Trabalhadores. Em outras palavras, o que estava em jogo neste congresso eram duas alternativas para o sindicalismo-CUT: a primeira, da CUT-movimento; a segunda, da CUT-organização. Esta venceu… Iniciava-se realmente a implantação da CUT como uma estrutura verticalizada, administrativa enfim, como uma organização complexa e, nesse sentido, burocrática. É a construção da empresa sindical dotada de racionalidade.

[…] Abria-se, agora, um novo patamar, onde a construção de um amplo aparelho administrativo, institucional, se colocava na ordem do dia.”[40]

O IV CONCUT, que ocorreu em 1991, foi um encontro com um número pequeno de delegados se comparado com os eventos anteriores. Nele, a disputa central entres as diferentes teses girava em torno do rumo da Central na década que se iniciava. A principal questão era se a CUT deveria marchar para ser “uma central de negociação, de contratação apenas, ou se deveria combinar seu papel de negociar com sua característica inicial de Central do enfrentamento, do confronto com o projeto global da burguesia.”[41]

Devemos ressaltar que este congresso ocorreu em um conjuntura muito difícil para o sindicalismo brasileiro. A vitória de Fernando Collor em 1989 representou um duro golpe em diversos setores do PT, da esquerda e, principalmente, no movimento sindical. A eleição de Collor representou a vitória do projeto neoliberal, que acabou colocando o sindicalismo em um posição bastante defensiva. A este fato somam-se as transformações propiciadas pela reestruturação produtiva, a crise dos sindicatos no âmbito internacional e o fim dos Estados socialistas do Leste Europeu, que criaram um estado de perplexidade e paralisia no sindicalismo-CUT, situação que já vinha desde o III CONCUT. Junte-se a isso os aspectos internos de estruturação da CUT e seu processo acelerado de institucionalização, que criou um distanciamento entre direção e base.[42]

Já no final da década de 1990, a essa política defensiva substitui-se uma de caráter propositivo, onde predomina a idéia de que o movimento sindical deve buscar, junto com o empresariado, soluções para os problema das empresas.[43]

  1. Conclusão

Tendo em vista o que foi analisado, acreditamos que alguns fatores podem explicar essa “judicialização das eleições sindicais”.

Em primeiro lugar, devemos considerar que, historicamente, pode-se observar no Brasil uma ligação estreita entre a organização dos sindicatos e o poder normativo estatal. Após a Revolução de 1930, tentou-se estabelecer um modelo corporativo de organização sindical, onde o Poder Executivo, por meio do Ministério do Trabalho, tinha legitimidade para organizar os sindicatos, podendo interferir em seus estatutos e em suas eleições. Essa faculdade do Ministério do Trabalho só terminou com o advento da Constituição Federal de 1988, que no inciso I do artigo 8o, estabeleceu que o Estado não poderia mais intervir na organização sindical.

Acreditamos que, após a promulgação da Constituição, o movimento sindical passou a cobrar do Poder Judiciário uma intervenção nos conflitos internos do sindicato, para que este ocupe o vazio deixado com a saída do Ministério do Trabalho.

Outro fator importante – e que está ligado ao primeiro – diz respeito a um processo de judicialização da política e das relações sociais, uma invasão do direito nas diversas esferas da sociedade, sendo a própria normatização das relações de trabalho uma situação paradigmática. Ainda, devemos observar que os trabalhadores, após anos de conflitos travados dentro do Poder Judiciário contra os empregadores, passaram a entender este espaço como legítimo para resolverem disputas internas ao movimento sindical.

Finalmente, devemos considerar o processo de adaptação institucional que ocorreu com o movimento sindical, especialmente com a CUT, durante a década de 1990. Neste processo, deixa-se de acreditar na organização independente dos trabalhadores, e passa-se a defender uma atuação política mais ligada às instituições, como, por exemplo, o Poder Judiciário. Soma-se a isso o processo de esvaziamento dos sindicatos na década de 1990. Não estamos falando aqui apenas do sentido quantitativo, mas também do fato de que os sindicatos são progressivamente vistos pelos trabalhadores como espaço de articulação de dirigentes para a consecução de seus próprios interesses.

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[1] SINDICATO MERCOSUL. Correio Sindical Mercosul. Disponível em http://www.sindicatomercosul.com.br /noticia02.asp?noticia=29325, acesso em 15/10/2007.

[2] A partir da promulgação da Emenda Constitucional no 45 de 2004, que incluiu o inciso III ao art. 144 da Constituição Federal, a Justiça do Trabalho passou a ser competente para “processar e julgar as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, sindicatos e trabalhadores e entre sindicatos e empregadores”. Na interpretação do novo dispositivo constitucional, fica revogada a antiga Súmula nº 4 do Superior Tribunal de Justiça, publicada em maio de 1990, que previa a competência da Justiça Estadual para julgar causa decorrente do processo eleitoral sindical.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, em http://www.tst.gov.br/, acesso em 10/10/2007.

[3] SINDICATO MERCOSUL. Correio Sindical Mercosul. Disponível em http://www.sindicatomercosul.com.br/ noticia02.asp?noticia=32420, acesso em 15/10/2007.

[4] JORNAL AQUI. Virou pó. Juíza determina e votos da eleição do Sindicato dos Metalúrgicos são queimados. Disponível em http://www.jornalaqui.com.br/arquivo/2006/488/paginas/csn.htm,acesso em 15/10/2007.

[5] SINDICATO MERCOSUL. Correio Sindical Mercosul. Disponível em http://www.sindicatomercosul .com.br/noticia02.asp?noticia=3742, acesso em 15/10/2007.

[6] INTERSINDICAL. Esclarecimentos sobre as Eleições no SINTRASEF – Rio de Janeiro. Disponível em http://intersindical.org.br/geral.php?id=posicao_nacional, acesso em 16/10/2007.

[7] SINTRASEF. Imprensa e divulgação – Chega de Farsa!. Disponível em http://www.sintrasef.org.br/home/ noticia.php?nid=429, acesso em 16/10/2007.

[8] MATTOS, Marcelo Badaró. O sindicalismo brasileiro após 1930. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003, p. 11.

[9] ARAÚJO, Ângela Maria Carneiro. Estado e Trabalhadores: a montagem da estrutura sindical corporativa no Brasil. In ARAÚJO, Ângela Maria Carneiro (org.) Do corporativismo ao neoliberalismo. Estado e trabalhadores no Brasil e na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 2002, p. 34.

[10] Loc. cit.

[11] ANTUNES, Ricardo. Classe operária, sindicatos e partido no Brasil: um estudo sobre a consciência de classe, da Revolução de 30 até a Aliança Nacional Libertadora. São Paulo: Cortez, 1988, p. 74.

[12] Ibid., p. 75.

[13] Podemos ver esse controle do Estado sobre os sindicatos se observamos alguns artigos do Decreto 19.770 de 19 de março de 1931:

Art. 1o Terão os seus direitos e deveres regulados pelo presente decreto, podendo defender, perante o Governo da Republica e por intermédio do Ministério do Trabalho, Industria e Comércio, os seus interesses de ordem econômica, jurídica, higiênica e cultural, todas as classes patronais e operárias, que, no território nacional, exercerem profissões idênticas, similares ou conexas, e que se organizarem em sindicatos, independentes entre si, mas subordinada a sua constituição ás seguintes condições:

[…]

  1. f) abstenção, no seio das organizações sindicais, de toda e qualquer propaganda de ideologias sectárias, de caráter social, político ou religioso, bem como de candidaturas a cargos eletivos, estranhos à natureza e finalidade das associações.

[…]

Art. 2o Constituídos os sindicatos de acordo com o artigo 1o, exige-se, para serem reconhecidos pelo Ministério do Trabalho, Industria e Comércio e adquirirem, assim, personalidade Jurídica, tenham aprovados pelo Ministério os seus estatutos, acompanhados de copia autêntica da ata de instalação e de uma relação do numero de sócios, com os respectivos nomes, profissão, idade, estado civil, nacionalidade, residência e lugares ou empresas onde exercerem a sua atividade profissional.

[…]

Art. 4o Os sindicatos, as federações e as confederações deverão, anualmente, até o mês de março, enviar ao Ministério do Trabalho, Industria e Comércio relatório dos acontecimentos sociais, do qual deverão constar, obrigatoriamente, as alterações do quadro dos sócios, o estado financeiro da associação, modificações que, porventura, tenham sido feitas nos respectivos estatutos, além de fatos que, pela sua natureza, se possam prender a dispositivos do presente decreto.

[…]

Art. 6o Ainda como órgãos de colaboração com o Poder Publico, deverão cooperar os sindicatos, as federações e confederações, por conselhos mistos e permanentes de conciliação e de julgamento, na aplicação das leis que regulam os meios de dirimir conflitos suscitados entre patrões, operários ou empregados.

[…]

Art. 15. Terá o Ministério do Trabalho, Industria e Comércio, junto aos sindicatos, às federações e confederações, delegados com a faculdade de assistirem às assembléias gerais e a obrigação de, trimestralmente, examinarem a situação financeira dessas organizações, comunicando ao Ministério, para os devidos fins, quaisquer irregularidades ou infracções do presente decreto.

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D19770.htm, acesso em 15 de maio de 2007.

[14] BOITO JR., Armando. Neoliberalismo e Corporativismo de Estado no Brasil. In ARAÚJO, Ângela Maria Carneiro (org.) Do corporativismo ao neoliberalismo. Estado e trabalhadores no Brasil e na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 2002, p. 60.

[15] CARDOSO, Adalberto Moreira. A década neoliberal e a crise dos sindicatos no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003, p. 128.

[16] Ver VIANNA, Oliveira. Direito do trabalho e democracia social: o problema da incorporação do trabalhador no Estado. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1951; VIANNA, Oliveira. Problemas de direito corporativo. 2. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 1983; CAMPOS, Francisco. O Estado nacional : sua estrutura, seu conteúdo ideológico. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1940.

[17] CARDOSO, Adalberto Moreira; LAGE, Telma. As normas e os fatos: desenho das instituições de regulação do mercado de trabalho no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007, p. 13.

[18] Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988.

Art. 8o É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

I – a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

IV – a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

V – ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

VI – é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

VII – o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;

VIII – é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.

Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.

[19] Ver CARDOSO, Adalberto Moreira. A trama da modernidade. Pragmatismo sindical e democratização no Brasil. Rio de Janeiro: Renavan, 1999.

[20] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 23a ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 788.

[21] Disponível em: http://www.oit.org/ilolex/portug/docs/C087.htm. Acesso em 20 de outubro de 2007.

[22] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Dogmática da liberdade sindical. Direito, política, globalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 421.

[23] Decreto-lei n.º 5.452, de 1º de Maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho)

Art. 518. O pedido de reconhecimento será dirigido ao ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, instruído com exemplar ou cópia autenticada dos estatutos da associação.

  • 1º Os estatutos deverão conter :
  1. d) as atribuições, o processo eleitoral e das votações, os casos de perda de mandato e de substituição dos administradores.

[24] MARTINS, Sérgio Pinto. Op. Cit., p.788.

[25] ROMITA, Arion Sayão, Sindicalismo, Economia, Estado Democrático: estudos. São Paulo: Ltr, 1993, p. 50.

[26] Unicidade sindical: Proíbe a criação de mais de uma organização sindical, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que não poderá ser inferior à área de um município. Assim, o sindicato deve ser registrado no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), e qualquer controvérsia em torno da representação sindical resolvida judicialmente.

Contribuição sindical: O empregado tem descontado, obrigatoriamente, um dia de trabalho todo ano para o custeio dos sindicatos, das federações e confederações, independentemente de ser sindicalizado. Tal contribuição é depositada numa conta na Caixa Econômica Federal e, posteriormente dividida entre as referidas organizações e à Conta Especial Emprego e Salário”, administrada pelo MTE.

[27] VIANNA, Luiz Werneck et al. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p. 15.

[28] Ibid., p. 17.

[29] Loc. Cit.

[30] Ibid., p. 259.

[31] Ibid., p. 20.

[32] Loc. Cit.

[33] Ibid., p. 22.

[34] Com relação à Justiça do Trabalho, observa-se que, a partir da Constituição de 1988 até 1997, ocorre uma explosão nas demandas trabalhistas individuais, constituindo um novo processo de judicialização das relações trabalhistas. Apesar disso, devemos ressaltar que, dentro do contexto que envolve os conflitos coletivos, é percebido um movimento contrário, tendo em vista que há uma queda no número de dissídios a partir de 1991.

Nesse sentido, ver CARDOSO, Adalberto Moreira. Op. Cit., 2003, pp. 110 – 113.

[35] Ibid., p. 23.

[36] “O mandado de injunção consiste em uma ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial, que visa suprir omissão do Poder Público, no intuito de viabilizar o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista na Constituição Federal.” MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 179.

“Declarada a inconstitucionalidade por omissão [pelo STF] de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em 30 dias. […] Assim, tem cabimento a presente ação, quando o poder público se abstém de um dever que a Constituição lhe atribuiu.” MORAES, Alexandre de. Op. Cit., p. 631.

[37] CARDOSO, Adalberto Moreira. Op. Cit.,2003, p. 131.

[38] RODRIGUES, Iram Jácome. Sindicalismo e política: a trajetória da CUT. São Paulo: Scritta, 1997, p. 99.

[39] WELMOWICKI, José. Cidadania ou classe? O movimento operário da década de 80. São Paulo: Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2004, pp. 80 e 81.

[40] RODRIGUES, Iram Jácome. Op. Cit., p. 117.

[41] Ibid., p. 183.

[42] Ibid., p. 182.

[43] ALVES, Giovanni. Trabalho e sindicalismo no Brasil dos anos 2000: dilemas da era neoliberal. In ANTUNES, Ricardo (org.) Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, p. 463.